quarta-feira, 14 de maio de 2008

Ninguém pode viver em nosso lugar, nem sofrer ou amar em nosso lugar. É o que chamo de solidão: nada mais é que outro nome para o esforço de existir. Ninguém virá carregar seu fardo, ninguém. Se ás vezes podemos nos ajudar mutuamente (e é claro que podemos!), isso supõe o esforço solitário de cada um e não poderia – salvo ilusões – substituí-lo. Assim, a solidão não é a rejeição do outro, ao contrário: aceitar o outro é aceitá-lo como outro (e não como um apêndice, um instrumento ou um objeto de si!), e é nisso que o amor, em sua verdade, é solidão. Rilke encontrou as palavras necessárias para dizer esse amor de que necessitamos, e de que somos tão raramente capazes: “ Duas solidões que se protegem, que se completam, que se limitam e que se inclinam uma diante da outra...” Essa beleza soa verdadeira. O amor não é o contrário da solidão: é a solidão compartilhada, habitada, iluminada – e, às vezes, ensombrecida – pela solidão do outro. O amor é solidão, sempre; não que toda solidão seja amante, longe disso, mas porque todo amor é solitário. Ninguém pode amar em nosso lugar, nem em nós, nem como nós. Esse deserto, em torno de si ou do objeto amado, é o próprio amor.

COMTE-SPONVILLE, André. O amor a solidão. São Paulo: Martins Fontes: 2001

Eri.


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